
As manifestações populares que acontecem no Brasil desde o
dia 6 de junho colocaram a reforma política de volta ao centro dos debates.
Mudanças nas práticas políticas, nas formas de representação e nas regras que
regem os governos e as eleições devem agora ser discutidas. Reclamada pelos
manifestantes, a reforma foi prometida pela presidente Dilma Rousseff, que
encaminhou ao Congresso a proposta de consultar a população sobre o tema.
Diversos assuntos podem ser incluídos na reforma política: a
duração dos mandatos, a possibilidade ou não de reeleição, a forma como devem
ser eleitos os deputados, as formas de financiamento de campanha, a
obrigatoriedade do voto, a possibilidade de candidaturas desvinculadas de
partidos e de revogação de mandatos por meio do voto, a suplência de
parlamentares, a frequência das eleições. Até o próprio sistema de governo pode
ser colocado em questão.
Veja a seguir os principais itens que podem figurar em uma
reforma política:
1. Reeleição
A reeleição para cargos executivos foi aprovada no Brasil em
1997. Hoje os governantes podem se reeleger uma vez consecutiva, sem
necessidade de deixar o cargo. O assunto foi muito polêmico na época e assim
continua até hoje – de modo que se discute tanto a ampliação da possibilidade
de reeleições consecutivas quanto a proibição de presidentes, governadores e
prefeitos se reelegerem.
Quem apoia a reeleição argumenta que ela permite aos
governos trabalhar com mais tempo, favorecendo maior estabilidade nas políticas
públicas. Quem é contra, lembra que há a possibilidade de o governante usar a
estrutura do governo para se promover e se reeleger.
A maioria dos países permite a reeleição. Nos Estados
Unidos, por exemplo, é permitida apenas uma reeleição e, normalmente, os
ex-presidentes não disputam outros cargos depois de oito anos de governo.
Alguns países latino-americanos permitem reeleições ilimitadas, como a
Venezuela e a Bolívia. Já o México não permite a reeleição.
O assunto foi discutido pelo Senado em 2011. Na época, uma
comissão especial criada para tratar da reforma política sugeriu o fim da
reeleição, mas a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) discordou
e rejeitou a Proposta de Emenda à Constituição 39/2011, do senador José Sarney
(PMDB-AP).
Depois disso, foram apresentadas outras propostas que mantêm
a reeleição, mas obrigam o governante a se licenciar do cargo para concorrer
novamente. São as PECs 48/2012, da senadora Ana Amélia (PP-RS), 73/2011, do
ex-senador Wilson Santiago e 65/2007, do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE).
As duas primeiras esperam decisão da CCJ. A terceira aguarda inclusão na ordem
do dia do Plenário do Senado.
2. Duração do mandato
Quanto deve durar o mandato do presidente, dos governadores
e dos prefeitos? Ao longo da História do Brasil, isso mudou várias vezes:
quatro anos durante a República Velha; cinco anos após a Era Vargas; o mesmo
período no começo da redemocratização, com José Sarney e Fernando Collor, e novamente
quatro anos a partir de Fernando Henrique Cardoso.
O debate sobre a duração do mandato costuma estar atrelado
ao da reeleição. Em geral, os políticos consideram curto o mandato de quatro
anos, de modo que é preciso autorizar os governantes a tentarem se reeleger. Já
aqueles que defendem o fim da reeleição em geral também defendem mandatos mais
longos, de cinco ou seis anos.
Como é em outros países? Há grande diversidade quanto a
isso. Nos Estados Unidos e na Argentina, o mandato presidencial é de quatro
anos. Na Venezuela e no México, de seis. Na França, de cinco e na Itália
parlamentarista, de sete.
Em 2011, a comissão especial que apresentou uma proposta de
reforma política sugeriu acabar com a reeleição e ampliar os mandatos de cargos
executivos para cinco anos. A CCJ rejeitou a ideia, mas a PEC 38/2011 continuou
tramitando na forma de um substitutivo apresentado pelo senador Renan Calheiros
(PMDB-AL) para alterar para dois anos os mandatos dos prefeitos eleitos em
2016, com o objetivo de que, em 2018 e nas eleições seguintes, todos os cargos
eletivos estejam em disputa. Essa PEC aguarda inclusão na ordem do dia do
Plenário.
3. Eleição de deputados: voto proporcional x voto
distrital
Este é um dos assuntos mais polêmicos quando se fala de reforma
política. De que maneira devem ser eleitos os deputados federais, estaduais e
os vereadores, valorizando os partidos ou destacando os próprios candidatos? Há
quase um consenso de que o sistema atual é ruim por distanciar o eleitor dos
eleitos, enfraquecer a identidade partidária e permitir a eleição de políticos
desconhecidos do público. Existem várias alternativas propostas, cada uma com
virtudes e defeitos.
Como é hoje: voto proporcional
Atualmente, o eleitor vota em um candidato, mas a eleição
depende também do desempenho de cada partido. Cada legenda tem o direito de
eleger um número de deputados federais proporcional ao número de votos que
obteve. São considerados eleitos os candidatos que obtiveram mais votos dentro
das vagas que cabem a cada partido.
Esse sistema é muito criticado por permitir a eleição de
candidatos com poucos votos que estejam em partidos bem votados. Com isso,
candidatos desconhecidos, ou mesmo rejeitados pelo eleitor, podem acabar sendo
eleitos graças a um candidato considerado “puxador de votos”.
As principais alternativas propostas são o voto distrital e
o voto em lista fechada, além da combinação de ambos, o voto distrital misto.
Voto distrital
Por esse sistema, cada estado é dividido em distritos
eleitorais, e cada um deles elege um representante, sempre o candidato mais
votado, independente do desempenho do partido. Por exemplo: O estado de São
Paulo, que hoje tem 70 deputados federais, seria dividido em 70 distritos e
cada um elegeria um representante.
Os defensores desse sistema argumentam que ele aproxima os
representantes da população representada, o que favorece a cobrança e a
fiscalização, e dificulta a eleição de pessoas identificadas a grupos de
pressão como sindicalistas e religiosos. Já os adversários afirmam que ele
enfraquece os partidos e diminui a possibilidade de que sejam eleitos
representantes de minorias.
Os principais países que utilizam esse sistema são a
Grã-Bretanha, os Estados Unidos, o Canadá e a Índia. No Brasil, o voto
distrital é defendido pelo PSDB.
Voto em lista fechada
Nesse modelo, o eleitor vota apenas no partido, e não em um
candidato específico. Cada partido terá uma lista de candidatos já definida e
já ordenada (por isso é chamado de “lista fechada”). Assim como no modelo
atual, cada partido elege um número de candidatos proporcional ao número de
votos que recebeu, obedecendo a ordem em que os candidatos aparecem na lista,
que deve ser elaborada por meio de prévias.
Os defensores dessa proposta afirmam que ela fortalece os
partidos, pois o eleitor escolhe entre plataformas partidárias, e não entre
personalidades. Já aqueles que são contrários dizem que o sistema permite a
eleição de pessoas desconhecidas, pois o eleitor tenderia a fixar a atenção
apenas nos primeiros candidatos da lista. Além disso, alegam que o compromisso
dos eleitos para com o eleitor seria menor.
O voto em lista fechada é praticado em muitos países, como
Argentina, África do Sul, Albânia, Espanha, Itália, Portugal, Bulgária e
Turquia. Sua adoção é defendida pelo PT e outros partidos aliados.
Voto Distrital Misto
Esse sistema é a combinação do voto distrital com o voto em
lista fechada. De modo geral, determina-se que cada um desses dois sistemas
será usado para preencher uma parte das vagas existentes. Nesse caso, o eleitor
votaria duas vezes: uma em um candidato de seu distrito e outra em um partido.
Há variações desse sistema, que modificam a forma como são escolhidos os
eleitos pelo voto proporcional.
Aqueles que defendem esse modelo consideram que ele combina
as vantagens do voto distrital e do voto proporcional: fortalecer os partidos e
aproximar os representantes dos seus eleitores. Assim, essa seria uma possível
solução para conciliar os adeptos dos outros sistemas.
Países como Alemanha, Coreia do Sul, Japão, Ucrânia e México
utilizam variações do voto distrital misto.
Outras propostas
O senador Francisco Dornelles (PP-RJ) propôs um modelo que
foi apelidado de “distritão”. A ideia seria eleger os deputados federais
simplesmente obedecendo a ordem dos votos nominais recebidos por cada um, sem
levar em conta a proporção de votos dos partidos, como se cada estado fosse um
grande distrito eleitoral. A proposta ainda tramita.
O Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE), que liderou
a coleta de assinaturas a favor da Lei da Ficha Limpa, divulgou no mês passado
uma outra proposta: a eleição dos deputados passaria a acontecer em dois
turnos. No primeiro, o eleitor votaria apenas no partido, definindo o número de
cadeiras a que cada um teria direito, de acordo com a proporção de votos que
recebesse. No segundo turno, o eleitor votaria em um candidato específico,
entre as opções oferecidas pelos partidos. Seriam eleitos os mais votados
dentro do número de vagas já conquistado no primeiro turno por cada legenda.
Em 2011, a comissão especial da reforma política aprovou o
voto em lista fechada. Quando tramitou na CCJ, o relator, senador Romero Jucá
(PMDB-RR), apresentou substitutivo, descartando a lista fechada e propondo o
modelo do “distritão”. Por sua vez, o senador José Pimentel (PT-CE) apresentou
voto em separado, recuperando o voto proporcional. Ao final, ambos os
relatórios foram rejeitados. O senador Jucá recorreu ao Plenário e o projeto
foi incluído na pauta, porém, atendendo a requerimento, acabou retornando à CCJ
para novo exame, onde o relatório propõe novamente a rejeição do voto
proporcional e a adoção do distritão.
Além disso, aguarda inclusão na ordem do dia do Senado a PEC
apresentada pela Comissão da Reforma Política, convocando referendo popular
para decidir sobre a validade de qualquer proposta que altere o sistema
eleitoral.
4. Financiamento de Campanha
Outro assunto bastante polêmico dentro da reforma política é
o financiamento das campanhas eleitorais. Hoje, dentro de certos limites, tanto
empresas quanto pessoas podem fazer doações. Além disso, cada partido recebe
recursos públicos provenientes do chamado Fundo Partidário, que são
distribuídos de acordo com o tamanho de cada bancada na Câmara dos Deputados.
Alguns problemas são levantados quanto ao financiamento de
campanhas: os gastos excessivos; a influência que o poder econômico pode ter no
resultado de uma eleição; e as doações ilegais, o chamado “Caixa 2”.
As propostas oscilam entre deixar tudo como está, apenas
fiscalizando melhor as doações; proibir as doações de empresas, permitindo
apenas as de pessoas físicas; ou proibir toda e qualquer doação privada,
estabelecendo que o governo financiará sozinho todas as campanhas eleitorais.
Os defensores do financiamento público afirmam que ele
facilita a fiscalização, elimina a influência de grandes empresas nas eleições
e permite que os partidos menores tenham mais recursos para fazer suas
campanhas. No entanto, contra a ideia pesam os argumentos de que seriam
favorecidos os partidos que hoje já são os maiores; não seriam coibidas as
doações ilegais, ou seja, esse sistema não acabaria com o Caixa 2. Além disso,
muitos consideram que o dinheiro destinado a financiar campanhas eleitorais
poderia ser usado para investir em saúde e educação, por exemplo.
Atualmente, o financiamento público de campanha é defendido
por partidos como PT e PCdoB.
Em 2011, a CCJ rejeitou a proposta de adoção do
financiamento exclusivamente público de campanhas eleitorais (PLS 268/2011).
Foi apresentado, entretanto, recurso para a votação dessa matéria em Plenário e
desde outubro de 2011 a matéria aguarda inclusão na ordem do dia. Também está
em tramitação o projeto de lei do Senado 140/2012, do senador Cristovam
Buarque. Aprovado na forma de substitutivo do senador Sérgio Souza (PMDB-PR),
ele determina que 45% das doações recebidas por cada candidato serão distribuídas
entre todos os partidos, de acordo com o número de votos na eleição anterior
para a Câmara.
O MCCE também tem proposta para o financiamento. Eles
sugerem que as doações de empresas sejam proibidas. As doações de pessoas
físicas seriam aceitas no valor individual máximo de R$ 700,00 e se somariam a
recursos do Orçamento no Fundo Democrático de Campanhas gerido pelo Tribunal
Superior Eleitoral.
Em caso de coligação, os recursos públicos a serem
destinados aos partidos não poderia exceder ao do maior partido da coligação.
Igual procedimento seria aplicado ao tempo de propaganda no rádio e na
televisão, evitando-se alianças não programáticas, ou seja feitas com o único
intento de aumentar as possibilidades das agremiações e candidatos envolvidos
na manobra.
No Meu Cariri
e A. Senado
Entenda alguns temas do debate sobre a reforma política
Reviewed by Francisco Júnior
on
17:29
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